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É hora de sair do casulo

Há muito tempo me sinto em silêncio. É como que um silêncio da alma. Devo medir as palavras, me encaixar, me adequar. Eu sabia que havia uma pressão, como que um invólucro transparente que me limitava, até mesmo, os meus gestos e ações. Era como se minha voz tivesse definhado e tudo que eu falava saía em sons quase que inaudíveis.

A noite escura da alma

No começo do ano passado, 2022, comecei a sair da depressão. Durante a pandemia eu fiquei visivelmente abalada, acabada, sem forças nem para o básico. Eu não podia voltar pra Índia, meu visto havia sido suspenso, fronteiras fechadas… era como se eu não pudesse viver a minha fé. Tudo que eu tinha era uma constante ansiedade, medo da morte e paredes ao meu redor. E eu clamei por Deus. Mas não foi uma ou duas vezes… eu pedia diariamente que me tirasse daquela situação. Eu não aguentava mais viver sem sentir meu próprio corpo, as mãos dormentes, o choro entalado, os olhos distantes…

E eu fui ouvida. Sinto que ali foi realmente o Eterno que estendeu sua mão até a mim e me resgatou do fundo do poço no qual eu me encontrava. Fui sutilmente conduzida por Ele para a igreja católica. O mundo já estava dando seus primeiros passos novamente, alguns ainda usavam máscaras, mas tudo estava lentamente voltando ao normal. Por muitas semanas eu ia à missa e logo em seguida à minha consulta com a psicóloga, que era bem pertinho da igreja.

E assim fui me curando, aos poucos. Foi um processo lento. Eu ainda não sentia o meu corpo – e aí digo num sentido menos literal. É como se eu não me sentisse dentro de mim mesma. Como se eu olhasse no espelho e não soubesse quem era aquela que me olhava de volta. E então encontrei ali, na igreja, um conforto, uma alegria, um comprometimento. Ali me fazia sentir que eu estava viva, que eu era vista, que pessoas falavam comigo. Eu me senti útil.

A cura?

Então eu percebi que eu havia me curado da depressão. Eu já estava funcionando normalmente, apesar dos meus dez quilos a mais. Interagia, cantava nas missas, sorria pras pessoas e sempre fui muito amável com todos que cruzavam o meu caminho. E assim permaneci por 1 ano, até o momento atual.

Conhecer minhas origens judaicas me deu uma chacoalhada na vida. Não vou negar, eu tento fingir que não me importo muito, mas isso mexeu completamente com o meu senso de identidade. Eu estou apta a fazer todo o processo de retorno ao judaísmo, sendo uma sefardita. Não necessariamente um retorno religioso, mas como povo judeu. E, quando eu soube disso e comecei a pesquisar com mais profundidade (quem disse que consigo ser rasa?), minha alma já tinha decidido o que eu deveria fazer, mas meu senso racional seguiu entrando em negação e colocando tudo o que poderia ser contra. É um eterno embate, minha alma dizendo sim, minha mente dizendo: pensa bem.

Mas, o que eu não imaginava, era que toda essa mexida na alma me causaria algo inacreditável: felicidade.

Agora sim, a cura

Eu achava que estava feliz, mas hoje eu olho pra esse último ano e percebo que eu estava numa espécie de “modo de sobrevivência”. Eu não estava feliz, eu estava apenas fazendo as coisas que eu tinha que fazer. Indo às missas, cantando, estudando… era como uma linha reta. O tal do “porque sim”. E quanto me olho hoje diante do espelho, eu consigo me ver novamente e meus olhos sorriem de volta pra mim. Consigo me empolgar com meus livros, com artigos sobre sagradas escrituras indianas, tema da minha pesquisa do mestrado, consigo enxergar Deus em tudo aquilo, novamente, inclusive comigo.

E então, percebo que rompi uma casca. Rompi o silêncio. Minha voz, hoje tem vida. Meus olhos sorriem. Sinto que estou apaixonada. Por quem? Sei lá por quem. Pela vida. Por quem eu sou. E dou graças a Deus por ter me dado a mão, me conduzido para onde eu deveria ter ido e por ter soprado sobre mim recentemente, a verdade a qual não posso mais negar. Eu sou o que sou, Ele disse. E eu também sou o que sou.

Minha alma hoje está feliz por ter vencido o embate.
Minha mente… ah, ela vai saber lidar com todas as críticas que vierem.

Sabe, minha gente… eu sempre aprendi que devemos agradar primeiramente a Deus. E o que eu penso é exatamente isso.

Como disse Santa Teresa D’Ávila:

Nada te perturbe
Nada te espante
Tudo passa, só Deus não muda.

A paciência tudo alcança
Só Deus te basta.

Estou pronta para sair do meu casulo de cura e recomeçar a minha jornada.

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