Eis que estou aqui novamente. Cada vez que abro o FocusWriter, me ajusto na cadeira, alinho a coluna e me ponho a escrever livremente, como um despejo mental. Eu sei que o momento da escrita do blog é um momento especial há uns 15 anos e é incrível como eu entro no mood em apenas alguns segundos.
Hoje vim contar a vocês sobre um momento de virada na minha vida. Sim, mais uma transformação está vindo aí, mas embora eu esteja ainda no meio de tudo isso, posso garantir a vocês que tem sido incrível experienciar – com um sorriso no rosto – o início de uma fase da minha vida que já estava batendo na porta, mas eu apenas não queria abri-la com medo…
Ah, o medo…
Estamos sempre seguros de si, achando que é melhor não arriscarmos algo diferente pois temos as nossas certezas, nossas identidades, nossas seguranças. Mas o que é seguro, afinal? Compartilho com vocês que já vinha ensaiando alguns passos de volta ao minimalismo, embora usar esse rótulo exaustivamente no passado tenha me cansado um pouco. Pra quem está chegando agora, eu explico: em 2010 eu criei um blog chamado Vida Minimalista e escrevi nele até 2019, quando passei a usar o meu nome. No entanto, embora eu tenha abandonado o rótulo, eu sempre mantive meus princípios e meu comportamento condizente com o que eu sempre escrevi no blog e compartilhei nas minhas redes sociais.
Hoje eu me vejo pronta pra recomeçar. Aliás, o movimento que estou vivenciando é mais do que isso: eu me sinto pronta pra abandonar uma parte imensa da minha imagem na internet, da minha identidade digital e profissional. Após um silêncio e um recolhimento introspectivo, percebi que algumas coisas em mim já não funcionavam como antigamente.
Depois da pandemia eu tentei resgatar cada pedacinho da minha identidade, a fim de testar, um por um, o que ainda fazia sentido pra mim. Naquele período caótico eu cheguei ao ponto de não saber mais quem eu era, do que eu gostava e como as pessoas me viam. A única solução ao sair da caverna foi resgatar o que sobrou de mim, passar por testes extremamente pessoais e refletir muito sobre minha vida num âmbito geral. Então, decidi me despedir de uma parte de mim que estava mais pesando do que me fazendo progredir, o que me fez sentir mais leve e pronta pra novas aventuras.
Eu tenho públicos diferentes que leem o meu blog: tenho aquelas pessoas desde o blog Vida Minimalista, que conhecem aquela Camile que fala sobre vida digital, organização, produtividade, minimalismo, slow living e tudo relacionado. Mas também tem aquelas pessoas que chegaram na minha vida na época em que eu dava aulas de Yoga que estava na Índia em 2019, que fazia mestrado e pesquisava sobre a digitalização das escrituras sagradas em sânscrito. Esse público sempre me respeitou demais e recebi muito carinho de todos, até que veio a pandemia e tudo ao redor congelou, como quando damos pausa em um vídeo.
Quando as coisas voltaram ao normal, eu precisei dar “play” novamente. Segui na minha carreira acadêmica fazendo o processo seletivo pro doutorado e passei, com um projeto ainda no campo da Indologia, pra pesquisar sobre oralidade indiana. As aulas começaram, os artigos bateram na porta, mas eu sentia um desencaixe enorme na busca de sentir novamente o que eu sentia durante o meu mestrado. A verdade, minha gente, é que eu nunca mais senti.
Imaginem o quanto isso me angustiava! Eu estava ali, cursando o primeiro ano do doutorado e precisava entrar no mood de 2019. Precisava resgatar a Camile da Índia, empolgada com os estudos indianos, que liderava grupos de pesquisa sobre o assunto, que fazia cursos de sânscrito e dormia de madrugada conversando com os indianos e fazendo entrevistas e comprando passagens pra Delhi. Mas tudo o que eu tinha agora era uma preguiça imensa só de imaginar que eu teria que fazer tudo isso de novo… e eu não queria enxergar que essa fase da minha pesquisa um dia chegaria. Era como se eu estivesse evitando o fato de não estar mais conectada com isso, a nível de pesquisadora, ou até mesmo de vivência pessoal e espiritual. Então pensei na possibilidade de facilitar as coisas. De ajustar minha pesquisa pra não ter que lidar tanto com isso… e foi aí que eu precisei ter uma conversa séria comigo mesma.
Eu não quero mais isso. O doutorado está sendo um peso pra mim, não por causa das aulas, que eu adoro. Não por causa dos grupos de pesquisa, que eu gosto tanto. Mas por causa da minha pesquisa. Ora, como é possível eu pesquisar algo que eu mesma escolhi se eu não me sinto com a mínima vontade de adentrar nesse tema? Algo estava muito, mas muito errado.
Em busca de respostas
Quando eu preciso de clareza mental eu já tenho um ritual: me desligo das redes sociais (estímulos externos e vozes alheias), faço uma limpeza digital, deixo de seguir muita gente, limpo meus emails, organizo meus arquivos e passo pro físico. Começo pelo guarda-roupas, tirando as roupas que eu não quero mais, revivendo algumas esquecidas e me vestindo, vendo como eu fico com aquelas peças do fundo da gaveta. Faço uma faxina, organizo os potes da cozinha, limpo a geladeira, faço compras mais saudáveis. Faço caminhadas no silêncio, sem fone de ouvido e levo um caderninho pra escrever meus pensamentos. E enquanto limpo, lavo roupa, organizo os livros, converso comigo mesma.
“E se…?”
E se eu fizesse de tal forma? E se fosse diferente? E se eu tivesse a coragem de chutar o balde e mudar tudo? Quem eu sou? O que eu já estudei? Quais as minhas qualificações? Meus cursos, minha especialização? O que faz vibrar meu peito quando eu falo sobre o assunto? O que eu mais tenho consumido ultimamente na internet, youtube, Reddit? Com qual fenômeno atual eu estou mais engajada? O que me faz ler sem pensar no tempo?
Foram muitas perguntas, mas todas elas apontavam para uma direção totalmente diferente do que eu estava indo, mas incrivelmente (re)conectadas com o que eu pausei lá no passado. As mídias digitais. A cultura digital. O minimalismo, o slow living, o foco e a atenção roubados nesse meio muito louco de internet e redes sociais. “E se…?”
Preciso tomar uma decisão
Por um minuto me imaginei tomando a decisão de mudar toda a minha pesquisa do doutorado e apontar para uma nova direção. E foi o minuto mais longo e feliz que eu passei, me fazendo sorrir e relaxar os meus ombros. O nosso corpo fala o tempo todo com a gente e só precisamos pausar, silenciar e escutá-lo.
Se antes eu estava completamente desanimada, agora eu estou tão empolgada que já rascunhei alguns artigos e tudo avançou em uma semana o que em meses estava estagnado. E o melhor, minha nova ideia é totalmente possível e compatível.
Eu tenho algumas ideias futuras de estudos e qualificações e sentia, o tempo todo, que o caminho que eu estava direcionando não era compatível com o que talvez eu quisesse. Eu sou muito tecnológica, queria mergulhar mais nisso, quem sabe até estudar programação… mas eu estava mais pro lado da Teologia, Ciências da Religião, Antropologia… Eu decidi inverter o jogo. Ainda não é definitivo pois preciso reajustar meu projeto. Mas vocês não imaginam o quanto isso me empolga, a ponto de pegar qualquer tempo livre do meu dia só pra me debruçar sobre o novo tema da minha pesquisa.
Nunca é tarde!
Compartilho isso com vocês, pois acredito que nunca é tarde pra mudarmos a direção de algo que já não combina mais conosco. Aliás, acredito que o quanto antes fizermos essa conversão, melhor, pois conforme o tempo passa, fica mais difícil. Então eu te pergunto: tem algo te angustiando em alguma área da sua vida? Você consegue refletir sobre isso e pensar em alternativas, mesmo que seja um pouco trabalhoso de fazer as mudanças necessárias? Como você se sente ao imaginar-se fazendo isso de forma diferente? O corpo fala. O corpo sente. O racional tem que atuar junto, claro, mas fica nítido quando não estamos mais vibrando junto com a decisão que tomamos lá atrás.
Até breve, Índia. Você ficará num cantinho especial no meu coração, na minha memória e nos meus hobbies. Mas deixo você ir embora da minha vida acadêmica pra outros estudos poderem ganhar espaço e poderem crescer a partir de agora.
Sucesso, Camile! ✨
Particularmente, gosto demais dessas temáticas que vc mencionou no post. Então já estou empolgada para acompanhar suas reflexões sobre os temas e desenvolvimento da pesquisa.
Vai no seu tempo e do seu jeito, respeitando seus momentos, que vai dar bom! 🙏🏽
Nossa, que texto maravilhoso!! Que vontade de mudar a direção!! Um sonho… Lindo… Feliz… Mas ainda muito distante!! Quero mudar de carreira. Estou trabalhando nisso já 3 anos!! Quem sabe um dia? Quem sabe?
Camile, muito obrigada por este post. Eu estou em uma fase da minha vida muito semelhante a sua. Me tornei mãe no começo do ano e, de lá pra cá, tenho repensado os meus sonhos e projetos para o futuro. Antes eu tinha algumas coisas como certas para a minha vida, mas agora não sei se são tão certas assim… Aos poucos estou entendendo que algumas metas não fazem mais sentido e que outras só precisam se reajustar nessa nova realidade. Não é fácil viver esse processo e eu percebo que a maior dificuldade vem de como somos apegados a imagem que temos de nós mesmos. Mas, apesar disso, tem sido transformador viver tudo isso. É como se eu estivesse renascendo, recomeçando, iniciando uma nova etapa na minha história.
Eu fico muito feliz em saber que você teve a coragem de seguir o que fazia sentido para a nova Camile. Tenho certeza de que terá muito sucesso no seu doutorado.
Um grande abraço,
Gabriela.
Parabéns pelo artigo! É impressionante como você conseguiu abordar o minimalismo de uma maneira tão prática e acessível. Suas dicas são muito úteis para quem está começando nesse estilo de vida. Continue com esse trabalho incrível, seu conteúdo tem o poder de transformar vidas!
Oi, Camile. Isso que você escreveu é tão real. Me vi um pouco em suas palavras e explico: Antes da pandemia eu era estudante de direito, dançava desde criança e nos últimos 10 anos me apaixonei pela cultura árabe então fui aprender danças e costumes. Veio a pandemia e mais ou menos por volta de 2021 eu desenvolvi fibromialgia por conta da infecção pelo covid. O fato é que de 2021 pra cá eu tentei muito muito muito voltar a ser a pessoa que eu era. Estava completamente apegada ao meu eu que amava dançar e se apresentar, mas quanto mais eu me apegava mais angústia sentia. Há alguns meses tomei a decisão de parar após 20 anos como bailarina e olha…doeu. Sinto vontade de dançar, de ir ver algo de dança, vibro sempre que vejo, mas hoje entendo que a situação mudou e que é hora de olhar para outro lado, afinal me formei e estou entrando no mercado de trabalho como advogada. Nesse momento sinto vontade de abraçar outras artes que não olhei por causa da ocupação integral com a dança e enfim, tem sido libertador.
Sobre a faxina: Eu estava fazendo isso nesse exato instante. Estou off de redes sociais há duas semanas aproveitando mini férias, acabei de fazer uma faxina em meus celulares pessoal e de trabalho, bem como no computador. A vida me pede pra ir em outra direção agora e tenho medo porque é tudo desconhecido ainda, mas estou de coração aberto para aceitar tudo que tem chegado até mim.